terça-feira, dezembro 6

Conto Maior

Tenho para mim que as sequelas (seja de filmes ou livros) são sempre piores que as primeiras versões, mesmo assim arrisco a continuação do  Conto menor (zinho), até porque este tem um final feliz e eu nestas coisas sou muito mariquinhas.
Adivinharam qual foi a primeira coisa que a Meredith lhe disse? Nada disso, caros leitores. Pensem pior, pensem hardcore, acertem-lhe na jugular ou onde lhe dói mais. Isso, atirem-lhe million dollar words antes de cair o pano.
Pois bem, passados muitos anos, a Meredith voltou a apaixonar-se. Não se pode dizer que tenham sido tempos fáceis, com o sacana do Clark a falhar pensões de alimentos enquanto passeava a dirty bitch num topo de gama que entretanto lhe tinha saído na rifa com a gestão de uma empresa juntamente com um chorudo cartão de crédito que ela (a outra) se encarregava de gastar nas lojas da Avenida. E ela, a contar os tostões, numa correria sempre com os filhos atrás, casacos puídos e sapatos baratos, a fazer contas à vida, pescada barata e carne picada numa contabilidade apertada como o coração no final do mês. "Que se empalassem os dois", ia vociferando quando a mais velha informava que o pai queria trocar o fim de semana por "motivos profissionais". E lá ia ela mudar de planos, quando se imaginava já no melhor dos mundos, dois dias interinhos de sofá e tostas, sem forças nem vontade.
Apaixonou-se finalmente a Meredith, sem o viço de outrora alimentado a bons cremes, cabelos brancos disfarçados em casa, unhas quebradiças e corpo trabalhado à base da exaustão da multi-vida. Um homem bom, todos lhe diziam, mas ela cheia de cagufa, como iria ser: ela com duas miúdas, ele com um filho, são três, a conta que Deus fez, que para o peditório da natalidade já tinha a sua conta.
Família nova, valha-me Deus que estou frita e sem idade para estas coisas. Felizmente são muitos os cunhados e as cunhadas, a algum havia de agradar, e ria-se com nervoso miudinho. É pegar ou largar, se não gostam, temos pena, que sou eu, o meu passado, com os meus dois mailindos do mundo, com amor à prova de bala. Mas o Steve era um homem bom, que a estimava e aos seus dois encantos e, fugindo ao azar dos Távoras, todos os cinco se davam bem.
Até hoje, lembrar-se-á sempre daquele almoço, casa cheia de gente de quem mal sabia os nomes, à rasca com tantas vozes e elogiava o bacalhau que mal lhe passava na garganta. Não fosse o carinho daquele homem bom, fugia dali a sete pés. Podia ser pior, ia pensando, enquanto se endireitava na cadeira. Quando no final se dirigiram para a cozinha e lhe deram um pano da louça igual ao de todos os outros, sentiu-se em casa.
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